NFT dá sinais de que veio para ficar

NFT
Obra digital de Pak

NFT continua em evidência. Novas vendas milionárias e uma questão que permanece no ar é: seria algo passageiro? Ainda é cedo para bater o martelo, mas se tivesse que apostar eu diria que é sim um caminho sem volta, eles vieram para ficar. Na nossa conversa de hoje veremos alguns dados e notícias que podem nos indicar essa permanência.

Semana passada o/a artista digital Pak (não se identifica, assim como Banksy) teve uma série de artes digitais vendidas por US$ 17 milhões em um leilão com duração de 3 dias que foi conduzido pela plataforma Nifty Gateway e a tradicional casa Sotheby’s. Dentre as obras está o trabalho “The Pixel”, que representa literalmente um pixel cinza, vendido por US$ 1,4 milhão. Na manchete do “The Wall Street Journal”, de 14/04/21, gostaria de destacar a frase “Pak é o nosso Picasso”. Neste pequeno vídeo da CNN é possível ver o ceo da Sotheby’s Charles Stewart falar brevemente sobre o leilão e o mercado de NFT’s:

https://edition.cnn.com/videos/business/2021/04/15/sothebys-ceo-digital-art.cnnbusiness/video/playlists/business-markets-investing/

NFT

Obra “500 cubos” de Pak

A comparação com Picasso parece desproporcional? Voltaremos a isso depois. Fato é que a venda de tokens tem apresentado cada vez mais possibilidades. Um NFT feito com um retrato de Edward Snowden (ex-técnico da CIA responsável pelo vazamento dos grampos feitos pelos EUA), produzido pelo fotógrafo Platon, que autorizou o seu uso, foi vendido por US$ 5,3 milhões. O dinheiro será direcionado para a Freedom of the Press Foundation, organização sem fins lucrativos que luta pelo direito à privacidade e liberdade de imprensa.

Outro mercado muito promissor é o de colecionáveis do esporte. De acordo com uma reportagem do InfoMoney, a empresa Topps que explora esse universo, informa que “o negócio de colecionáveis físicos da Topps movimentou US$ 314 milhões em 2020, com outros US$ 31 milhões em vendas digitais. A expectativa para 2022 é de atingir US$ 454 milhões nas vendas físicas e US$ 51 milhões nas vendas digitais”. O rei Pelé terá sua própria coleção de NFT’s, a novidade foi anunciada nas suas redes sociais e como nos informa a matéria do GE “A coleção de Pelé, criada pelos artistas Kingsletter e Visual Lab, será lançada no dia 2 de maio na blockchain Ethernity. A empresa ainda não divulgou informações sobre o conteúdo da NFT de Pelé, que pode ser criada a partir de vídeos, fotos ou gifs”.

Artistas da indústria musical também estão cada vez mais presentes no criptoverso. Em outra reportagem o InfoMoney conta um pouco sobre a plataforma brasileira Brodr, que tem como um de seus fundadores Márcio Buzelin, tecladista da banda Jota Quest, conforme informação da matéria “A startup comercializa NFTs de direitos autorais de letras de músicas e fonogramas. Em 2020, mais de 4.000 NFTs foram distribuídos por meio de três ofertas no marketplace que conecta artistas e investidores”. A cantora Pabllo Vittar já anunciou que está preparando um drop de NFT para ser lançado ainda este ano.

Há aproximadamente 1 mês a artista Krista Kim vendeu o NFT do projeto de uma casa 3D (Mars House) que, além de proporcionar uma experiência imersiva, pode ser carregada em qualquer metaverso. O valor da venda foi de aproximadamente US$ 500 mil. De acordo com o site TecMundo, “Kim acredita que, em breve, a realidade virtual será ainda mais presente na vida das pessoas. Quando isso ocorrer, afirma, a arte digital ganhará mais relevância, pois permitirá que as pessoas expressem seus gostos, com peças decorativas e colecionáveis. Aliás, ela é fundadora do movimento Techism, que busca promover a união da arte e da tecnologia, incentivando a inovação como uma forma de impulsionar o humanismo digital”.

 

Na plataforma SuperWorld é possível comprar lotes de terra em qualquer lugar do planeta em NFT. Como nos explica o site Tecnoblog “O SuperWorld é basicamente uma versão do planeta Terra em imagens por satélite, assim como o Google Earth, mas que propõe a criação de um sistema imobiliário digital, no qual você pode comprar, vender e negociar propriedades de qualquer lugar do mundo através da criptomoeda ether (ETH), nativa do blockchain da Ethereum, rede na qual o universo virtual é hospedado”. O “proprietário” pode criar e customizar o terreno como bem desejar e “além disso, todo proprietário nesse universo se torna automaticamente uma espécie de acionista da empresa, com participação nos lucros de atividades que envolvem seu token, como jogos, eventos, e-commerce e publicidade”.

***

No vídeo da CNN sobre Pak, podemos ver que a apresentadora pergunta ao ceo da Sotheby’s quem são os compradores? Outra pergunta que sempre aparece com relação aos NFT’s é: por que comprar? São dúvidas válidas e creio que elas ocorrem para a maioria das pessoas que não estão tão familiarizadas com essa, vamos dizer, realidade alternativa. Por que alguém compraria um terreno no mundo virtual? Uma casa? Por valores equivalentes ou até superiores aos do mundo físico?

Aqui as características geracionais, apesar de não serem precisas, podem nos ajudar. Estamos em um momento do mundo onde pessoas que nasceram em diferentes épocas e contextos coexistem. Neste caso, o que seria uma “realidade alternativa” para um baby boomer, e talvez até para alguém da geração x, para os millennials possivelmente não seria visto como algo alternativo e para a gen z chamar de alternativa não faz nenhum sentido, a distinção entre on e off line praticamente não existe para esses últimos. A diferença principal, aqui para o nosso bate-papo, está justamente nessa fluidez, nessa capacidade/característica que algumas pessoas – e isso independe da geração – têm de enxergar o virtual não como “alternativa”, mas muito mais como extensão da realidade ou a própria realidade em si.

Reforço que essas divisões não são tão fiéis e podem produzir estereótipos que mais atrapalham que ajudam. Outra coisa que precisamos levar em conta é a questão do desenvolvimento econômico, tecnológico e o acesso à informação e ao conhecimento. Discutimos aqui, de maneira introdutória, os aspectos mais gerais, sem nos aprofundar nas especificidades de cada país. Sabemos que as coisas não funcionam de maneira uniforme no mundo e, principalmente, no Brasil. Diferentes realidades coexistem no mundo físico também.

Em suma: trata-se de um nicho muito específico de mercado. Tomemos como exemplo a indústria de games/jogos. Segundo informações do site MacMagazine em 2020 cinco jogos para mobile tiveram faturamento superior a US$ 1 bilhão:

“Os dois líderes isolados da métrica são ambos da chinesa Tencent: em primeiro lugar está PUBG Mobile (combinado com sua versão adaptada para a China, Game for Peace), com absurdos US$ 2,6 bilhões arrecadados ao longo do ano — uma alta de 64,3% em relação a 2019. Na vice-liderança, temos Honor of Kings, com US$ 2,5 bilhões (42,8% a mais em relação ao ano passado). Em terceiro lugar, com US$ 1,2 bilhão, Pokémon GO provou que não foi apenas um fenômeno meteórico — os rendimentos são 31,5% superiores em relação ao ano passado. Coin Master e Roblox completaram o Top 5, ambos com US$ 1,1 bilhão gerados ao longo de 2020”.

NFT

Fonte: site Roblox

Como nos explica o site Mundo Conectado: “como já era de se esperar, as principais fontes de receita para as empresas de games para celular são os anúncios e as microtransações. As microtransações, e outras formas parecidas de comprar coisas dentro dos aplicativos, são responsáveis por 43% de todo o faturamento da indústria de jogos mobile”. Essas microtransações são as compras de acessórios, aprimoramentos, boosters (power up), vidas e afins. São itens que serão utilizados dentro do jogo. Claro que essas compras, se olhadas individualmente, estão bem longe de serem comparadas aos valores pagos pelas obras do Beeple ou Pak, mas vimos o que elas representam quando somadas. Elas ainda nos fornecem uma informação muito importante: comprar coisas para serem consumidas/utilizadas apenas no mundo virtual é mais normal do que podemos imaginar.

Em alguma medida isso já acontece no mundo físico. Quando vamos a um museu, assistimos a um filme no cinema, shows ou peças de teatro. Pagamos o ingresso, consumimos e retornamos para nossas casas apenas com a experiência vivida. Podemos até comprar souvenires, mas são produtos adquiridos a parte. É possível objetar que são vivências diferentes (virtual x presencial), mas cada pessoa tem a sua preferência, é afetada de maneira diferente e produz impressões diversas, é algo muito subjetivo. Alguns não gostam de jogar, outras não suportam lugares cheios. Afinal, quantas pessoas ainda recebem jornal impresso em casa?

Seria Pak o/a novo/a Picasso? Não creio que trata-se de confrontar tradição x novo ou ainda escolher se o mundo físico é melhor que o virtual ou vice-versa. Como já mencionado em alguns textos, estamos em uma fase de mutação. O avanço tecnológico alcançado em tão pouco tempo provocou um interregno (emprestei o termo da política e o adapto aqui), o antigo ainda existe/resiste e o novo até já existe, mas ainda está em construção. Neste momento creio que o mais sábio seja olhar para essas duas entidades e vê-las como complementares e não antagônicas. Transitamos com maior ou menor fluidez entre os universos físico e virtual e não precisamos escolher qual o melhor, podemos aproveitar os benefícios proporcionados pelos dois lados e, o mais importante, podemos ajudar a construir esse novo da melhor maneira possível.