Bolha NFT estourou? Algumas reflexões

Doge - Meme

O ano de 2021 começou com a ascensão das vendas, e valores, dos tokens não-fungíveis, os NFT’s. Termo que causou um misto de admiração e dúvida e que foi responsável por, se não exatamente quebrar, pelo menos chacoalhar alguns paradigmas principalmente na arte. De acordo com uma reportagem da revista Exame, um estudo mostrou que o volume de negociações de NFT’s despencou 90% e a quantidade de usuários ativos estaria com apenas 30% da máxima. Isso significaria que a bolha NFT, como alguns previram, estourou.

Bolha NFT

CryptoPunk #7523

A reportagem se baseia em um estudo publicado no site Protos, que apresenta alguns gráficos para mostrar a queda nos negócios. De acordo com o site a bolha teria durado quatro meses e atualmente as maiores vendas se concentram entre os NFT’s colecionáveis como os CryptoPunks e Hashmasks. Em 03/06/21 o Cryptopunk #7523 foi vendido pela Sotheby’s por US$ 11,8 milhões. CryptoPunks são um conjunto de 10.000 personagens de pixel art feitos pela Larva Labs em 2017. O que foi vendido pela Sotheby’s – “CryptoPunk #7523” – é da variedade Alien, uma das mais procuradas, com pele azul-esverdeada e usando uma máscara facial.

Bolha NFT

Bolha NFT

A própria Sotheby’s acabou de abrir a sua versão virtual no metaverso. É possível visitá-la no Voltaire Art District do Decentraland, um mundo virtual descentralizado e que pertence aos seus usuários.

Decentraland

O meme conhecido como Doge, que inclusive deu origem a uma criptomoeda, foi transformado em NFT e foi leiloado por US$ 4 milhões que serão destinados à caridade. A foto da cachorrinha da raça Shiba Inu, que se chama Kabosu na verdade, foi compartilhada milhões de vezes e recebeu até o prêmio de meme da década em 2019 do site Know Your Meme.

Recentemente o influencer Felipe Neto anunciou a criação da 9Block, uma plataforma que, de acordo com informação do site, “nasce para ajudar artistas e colecionadores a se conectarem de um modo fácil ao mundo das artes digitais e das NFTs. Por utilizar a blockchain da Hathor, a 9block eliminou o custo de cunhagem e de transferência da arte, democratizando o acesso a esse novo mercado”. Os pagamentos podem ser feitos em criptomoeda ou cartão de crédito (via PayPal). A 9Block vem se juntar à plataforma Hic et Nunc, também brasileira, que opera na blockchain da Tezos e também possui a vantagem de ser mais acessível e eco-friendly (clean NFT).

Esses exemplos parecem contradizer o estouro da bolha, mas precisamos nos recordar que o fato de uma bolha estourar não significa o desaparecimento, neste caso dos NFT’s, mas que os valores parecem voltar aos patamares “normais”.

***

Quem acompanha nosso portal já se deparou com alguns textos sobre NFT. Para muitos pode ser algo distante e até mesmo de pouca importância, mas aqui acreditamos que informação e conhecimento são valiosos, por isso tentamos trazer esses assuntos da maneira mais didática e acessível possível.

Vocês já devem ter visto as notícias de que El Salvador se tornou o primeiro país do mundo a oficializar o Bitcoin. Ela vai funcionar como uma segunda moeda e vou destacar aqui a headline da matéria do El País: “O preço que o presidente de El Salvador está disposto a pagar para ‘bitcoinizar’ o país: Um anúncio em inglês em uma conferência em Miami e a aprovação expressa da criptomoeda transformaram Bukele em herói ‘geek’. Mas a volatilidade e o crime cibernético preocupam os especialistas”, ela resume bem porque todos deveriam ficar atentos.

A aprovação foi feita às pressas e seu anúncio em inglês em um megaevento em Miami. Sabemos que El Salvador é um país pobre, que tem o dólar como moeda oficial, que fala espanhol, onde 42% da população vive nas áreas rurais, mas sabemos que mais de 20% do PIB vem do dinheiro que é mandado por pessoas que deixaram o país para trabalhar e fazem as remessas para suas famílias. A divulgação foi feita principalmente para essas pessoas, pois teoricamente o envio via Bitcoin seria mais fácil. Em 90 dias pessoas que nunca ouviram falar de criptomoedas precisarão estar preparadas para fazer e receber pagamentos em Bitcoin.

Existem muitas questões econômicas e políticas envolvidas e vale a pena acessar as reportagens sobre o assunto. Mas o que eu quero destacar é a falta de um debate maior sobre o assunto com a população local e a necessidade da “alfabetização cibernética”, como foi chamada na reportagem, de todos; as pessoas estarão expostas aos golpes e principalmente à volatilidade da moeda. Esse é um caso que precisa ser acompanhado.

Isso nos faz pensar naquele velho ditado que diz que “de boas intenções o inferno está cheio”, muitas narrativas são sequestradas e distorcidas de maneira a beneficiar um determinado grupo. Se criptomoedas, metaversos e NFT’s são uma espécie de mundo em construção que prometem mais transparência e liberdade para as pessoas, precisamos participar ativamente desse processo para que ele se torne realmente um novo mundo e não um que replique os mesmos vícios do “mundo físico”. Podemos ser obrigados a lidar com esses assuntos da noite pro dia, como aconteceu em El Salvador, e não é muito difícil outros líderes quererem pegar carona nesse bonde.

Bolha NFT

Un pequeño restaurante en la playa de El Zonte, en Chiltiupan (El Salvador), que acepta bitcoins en una foto del 8 de junio.JOSE CABEZAS / REUTERS