Fotografia: 30 artistas para seguir – parte 2

Foto: ©Nana Moraes - da série Ausência, que trata da relação entre presidiárias e seus filhos

Conforme prometido agora vamos falar sobre fotografia no Brasil. Comentei anteriormente que escolher 30 artistas era uma tarefa complicada e selecionar 15 nomes por aqui também não foi fácil, mas, como já havia mencionado na primeira parte, o foco no humano se mantém e muitos diálogos e reflexões entre os dois grupos serão possíveis.

Quero começar com o coletivo 16) Favelagrafia (@favelagrafia): RJ, idealizado pelos designers André Havt e Karina Abicalil, o projeto é formado por 9 fotógrafos-moradores de comunidades que, através da foto, procuram mostrar a face menos conhecida da vida na favela e romper os estereótipos para além da violência noticiada todos os dias.

 

Fotografia Favelagrafia

Foto: ©Favelagrafia

 

Aproveito para seguir com mais dois representantes do tema “lugar de fala”, que foi levantado, na primeira parte, com relação às fotos de Jimmy Nelson, mas sem querer desenvolver muito o assunto, apenas mostrar outras maneiras de narrar uma história. Depois dos moradores das comunidades assumirem as câmeras e mostrar as suas versões chega a vez de 17) Edgar Kanaykõ Xakriabá (@edgarkanayko): MG, ele utiliza a fotografia para retratar o Povo Xakriabá, maior povo indígena do estado de Minas Gerais. Como diz o próprio Edgar (Entrevista no site Nossa Causa: http://nossacausa.com/casa-de-cultura-xakriaba/):

Os jovens aprendem a usar ferramentas de multimídia para captar e registrar aspectos da cultura para que não se percam e possam ser repassados para a comunidade e também usados como material didático pelas escolas. Ainda é bem recente, mas alguns produtos já foram feitos, como pequenos livros e documentários etnográficos em andamento. Lembrando que muitos desses produtos surgem dos projetos realizados pela AIXABP – Associação Indígena Xakriabá Aldeia Barreiro Preto, no qual a Casa de Cultura Xakriabá está ligada.

18) Marcela Bonfim (@bonfim_marcela): SP, vivendo em Rondônia, com o projeto “Amazônia Negra” Marcela retratou negros e negras na Amazônia em comunidades quilombolas, exercendo suas ocupações (na sua maioria serviços domésticos), os rituais de terreiros de candomblé, festejos religiosos e penitenciárias. A mudança para Rondônia também funcionou como um processo de auto-identificação, ao registrar a luta pela preservação de uma cultura a fotógrafa passou e se ver como mulher, negra vivendo na Amazônia e todos os questionamentos que isso pode provocar.

De volta para o Rio 19) Valda Nogueira (@valdanogueira): RJ, fotógrafa e artista visual, Valda faz parte do coletivo Farpa e é membro da plataforma de mulheres fotojornalistas Women Photograph. Seu trabalho também está centrado em povos, cultura, territórios e ancestralidade.

 

Fotografia Valda Nogueira

Foto: ©Valda Nogueira

 

20) Daniel Marenco (@danielmarenco): RS, fotojornalista possui um trabalho documental bastante rico, mas aqui quero destacar o seu documentário Contramaré onde mostra jovens da comunidade da Maré, no Rio de Janeiro, que tentam enfrentar as dificuldades do dia a dia através da música clássica com a Orquestra Maré do Amanhã, infelizmente não sei onde é possível assistir, se alguém souber, por favor, me avisa! Não podemos nos esquecer que Marielle Franco era “cria da Maré” e militou pelos direitos humanos até sua vida ser brutalmente interrompida há pouco mais de um ano.

21) Eneida Serrano (@eneidaserrano): RS, junto com Jacqueline Joner possuem um trabalho fantástico dentro da fotografia, mas elas estão aqui também por serem pioneiras no fotojornalismo feito por mulheres. Ambas iniciaram suas carreiras em 1974, quando estagiaram no Jornal Zero Hora e ambas foram demitidas pelo mesmo motivo: não se adequavam ao padrão tradicional, ou seja, eram mulheres e muito revolucionárias. Como disse a própria Eneida, em uma entrevista “estava conhecendo uma atividade que não era uma atividade esperada para uma mulher exercer, mas era o momento em que aquilo passou a ser possível para uma mulher exercer”.

Eu entrei em contato com o trabalho dos fotógrafos: 22) Maurício Nahas (@mauricionahas2) (SP); 23) Paulo Mancini (@pgmancini) (SP) e 24) Ricardo Barcellos (@ricardobarcellos) (RS) em 2011, ao visitar a exposição “Trilogia Vermelha: China” na Pinacoteca do Estado. Foi parte de um projeto que iniciou em 2005 e que também contava com imagens da Rússia e de Cuba. Os três fotógrafos transitam entre moda, publicidade, trabalhos conceituais e documentais e em 2010 os três fotografaram a China. Eu coloquei eles juntos para propor um exercício: visitem os respectivos sites, lá é possível ver as fotos desse projeto, e vejam a maneira peculiar com que cada um produziu as suas imagens, o recorte e a linguagem escolhida por cada um, vale a pena.

E para aproveitar a deixa, 25) Nana Moraes (@nanamoraes_fotografia): SP, também presente na moda e na publicidade além de trabalhos documentais. Nana vê a fotografia como narrativa, é a escrita com a luz levada ao pé da letra. Em uma entrevista ela reforça que “o importante é o ser humano, é trazer a complexidade do ser humano para o meu trabalho e dar voz às pessoas excluídas através do meu trabalho” (entrevista para o canal No Olhar: https://youtu.be/bKzQpLmjYhU).

 

Fotografia Nana Moraes

Foto: ©Nana Moraes – da série Ausência, que trata da relação entre presidiárias e seus filhos

 

26) Sofia Borges (@sofiadborges): SP, artista visual utiliza a fotografia não apenas para produzir imagens, mas principalmente para pensar a imagem. Como ela mesma diz suas imagens são incógnitas, é um mistério que se apresenta para ser resolvido, ou para pelo menos ser pensado. Destaco a série “A máscara, o gesto e o papel“, de 2017, com imagens feitas no Congresso Nacional e que fez parte da exposição Corpo a Corpo: a disputa das imagens, da fotografia à transmissão ao vivo, realizada pelo IMS.

27) Luisa Dörr (@luisadorr): RS (atualmente vive na Bahia), Luisa é uma exímia retratista e em 2017 ela fotografou doze capas para a revista norte-americana Time. A série se chamava “Firsts” e trazia mulheres inspiradoras que tinham sido as primeiras a conseguir realizar algo muito significativo. Curiosidade: ela fez as imagens com iPhone o que gerou polêmica na comunidade fotográfica. Esse assunto também renderia um post, mas vou me limitar a deixar apenas uma pergunta no ar: afinal, quem faz a foto?

 

Fotografia Luisa Dorr

Foto: ©Luisa Dörr

 

28) Fernanda Magalhães: PR, a artista usa o próprio corpo para questionar os padrões de beleza impostos pela sociedade. O que é ser uma pessoa gorda em um mundo que prega a magreza como default? Para Fernanda é uma transgressão e a auto-aceitação acaba por se tornar uma forma de resistência, sua arte, em certa medida, funciona como uma terapia para si e para o espectador, não apenas para aqueles que precisam curar suas feridas ao se verem refletidos, mas também para aqueles que precisam curar o próprio preconceito.

Calma que estamos na reta final. Eu quase que termino essa segunda parte com conflito também, mas não vou, vai ser o penúltimo! 29) Mauricio Lima (@limauricio): SP, fotógrafo documental com foco em conflitos premiadíssimo, pensando agora acho que ele poderia muito bem ter entrado na categoria obrigatório. Susan Sontag tem um livro chamado “Diante da dor dos outros” que aborda as imagens da dor e da guerra e eu separei uma frase: “uma foto só tem uma língua e se destina potencialmente a todos”; a foto de conflito é isso, não tem como se fazer de desentendido. A narrativa pode até ser sequestrada, mas a tragédia que a câmera captou está ali, não importa quem e por que, a dor é fato. E fecho nossa jornada com 30) Renato Stockler (@renatostockler): SP, fotografia de rua e documental. Em algumas de suas imagens o humano aparece como um vestígio e confirma uma das principais características da fotografia: a presença-ausência.

 

Fotografia Renato Stockler

Foto: ©Renato Stockler

 

Considerações finais

Quem está mais familiarizado com a fotografia já deve ter ouvido que uma foto carrega muito do fotógrafo, e não tem como ser de outro jeito, nossa bagagem de vida acaba se refletindo nas nossas criações. E como construímos essa bagagem? Com muito estudo, mas principalmente observando e, neste caso, observar o trabalho de outros fotógrafos ajuda bastante. Como disse no começo da primeira parte, essa lista poderia ser completamente diferente, mas a minha tentativa foi trazer temas que estão em discussão no mundo atual e artistas/trabalhos inspiradores. Muito mais do que oferecer respostas, creio que o mais importante seja ajudar a fazer as perguntas corretas. A pincelada pelos artistas foi rápida, até pela limitação do meio, a ideia é funcionar como um ponto de partida. Nos dois momentos surgiram assuntos que demandariam posts separados e essa é a deixa para sugestões. Se você chegou até aqui muito obrigada!